Batendo na Porta do Céu

- Eu posso entrar?
- Ed, em seu coração você sabe que não.
- Mas... Tudo o que eu fiz na minha vida foi pelo Senhor! - disse Ed, desesperado.
- Meu filho, até para mim você tenta mentir? Na realidade você não acreditava na minha existência, isso não é um problema. Saiba que eu sou onisciente, você não pode me enganar, você nem tem motivos. - A voz do criador era suave e acolhedora.
Ed chorou, suas lágrimas eram sinceras.
- Eu sei que fui ganancioso, mas eu trouxe várias pessoas para perto de ti, mesmo que da maneira errada. - Ed tinha todo o peso da culpa e suas palavras pareciam quase soluçadas.
- Não, essas pessoas já estariam junto a mim, o que você fez foi cumprir o seu papel e transformar a vida delas em um inferno, igrejas não são necessárias eu estou em todas as partes.
- Se esse era meu papel porque serei punido? Só cumpri o que você planejou para mim.
- Meu anjo, eu não planejei nada, você tinha o livre-arbítrio, assim como todas as criaturas, o destino foi só mais uma mentira que você e seus empregados espalhavam, o que atrapalhou o desenvolvimento pessoal de milhões de pessoas.
- Senhor, eu passei boa parte da minha vida trabalhando pela libertação do mal.
- Você não é um doce? Mas era tudo encenação, você está se enganando. Fizeste muitas pessoas se aproximarem do mal, não existem demônios, todo o mal da terra vem de homens, homens como você.
- Eu juro que conheci muitas pessoas que melhoraram de vida depois que entraram para minha igreja, eu fiz algum bem.
- Eu sei, essas pessoas teriam encontrado a fé mesmo sem sua ajuda, você realmente não percebe quantas pessoas reprimiu? Quantas vidas manteve na dificuldade?
O calmo sorriso do Senhor não diminuía, talvez não estivesse realmente descepcionado, mesmo enquanto falava sobre o que desaprovava:
“Pense na Maria, ela era uma mulher bondosa, simples e que não precisava de muito. Se não tivesse dado tanto dinheiro para sua igreja para supostamente ajudar a minha obra, ela não teria passado tanta dificuldade no fim da vida, certamente teria juntado dinheiro suficiente para ajudar outras pessoas com ele. O José é outro exemplo, tinha o sonho de espalhar suas ideias pela música, a qual tinha muita dedicação, mas perdeu oportunidades para não entrar no mundo maligno das bandas mundanas, supostamente sempre em contato com o demônio. As bandas gospel que participou não o deixavam compartilhar suas letras políticas que poderiam ajudar outras pessoas a entender o mundo.”
- Ed, esses são só alguns dos exemplos entre as milhões de pessoas que você afetou negativamente. Me usando como desculpa você foi responsável por mortes, mentiras, roubos e outras atrocidades. Tudo por simples ganância, sem nenhuma empatia pela inocência e bondade dos outros. Você até se divertiu com isso, agora a diversão acabou.
- Vou ser mandado para o inferno? - Ed já não chorava mais, sua tristeza já não cabia no peito.
- Não existe inferno, o inferno é o mundo, mas você ainda não está pronto para voltar. Tem o universo inteiro para vagar, o limite é aqui, na porta do paraíso.
- Há outras pessoas vagando?
- Inúmeras, mas vocês nunca se encontrarão.
- E o Senhor, vai continuar aqui?
O criador não respondeu, simplesmente desapareceu.

Comentários

  1. A ideia é que ele vai ser um fantasma vagando pelo espaço até estar pronto pra voltar pro mundo?

    Eu achei legal a ideia da história, mas senti falta de alguma coisa. Você comentou no grupo que queria feedback sobre diálogo, e acho que pode ser isso - pra uma situação tão emocional, todo mundo parece muito calmo. Os personagens conversam de forma lógica, num ritmo calmo e contínuo. Às vezes se ao invés de serem frases mais longas com vírgulas, fossem mais curtas com pontos, poderia transmitir mais energia mais facilmente.

    ex:
    original:
    - Eu sei que fui ganancioso, mas eu trouxe várias pessoas para perto de ti, mesmo que da maneira errada.
    alternativa:
    - Mas eu trouxe várias pessoas pra perto de você! - as lágrimas agora escorriam por sua face. - Dia após dia, mais e mais pessoas. Isso tem que contar pra alguma coisa, Senhor!

    Ed também parece entender e aceitar tudo imediatamente, o que no geral costuma ser mais difícil pra alguém num estado emocional mais intenso.

    original:
    - Se esse era meu papel porque serei punido? Só cumpri o que você planejou para mim.
    alternativa:
    - Meu papel...? Mas se eu cumpri o meu papel porque vou ser punido?!

    Isso de aceitar tudo com facilidade também é visto na questão de aceitar a própria culpa. É verdade que ele tenta mentir no começo e é informado que não adianta, mas a força do hábito é forte - se ele está acostumado a não admitir, a negar até o fim, teria dificuldade em admitir completamente sem ressalvas, mesmo numa situação em que logicamente não faria sentido mentir.
    O que quero dizer com isso não é que ele não admitiria a própria culpa, mas que mesmo que quisesse ele teria dificuldade se não estivesse acostumado com isso. Daí a admissão podia vir fraca e acompanhado talvez de eufemismos, justificativas, contra-argumentos - como uma forma automática de diminuir a admissão. Ed argumenta sim, mas é algo separado de sua admissão de culpa, e é algo que parece mais um debate lógico.

    No geral achei que o ritmo da história pareceu bem tranquilo ao longo dela toda. Acho que pode ser que se tivesse uma progressão de Ed cada vez mais desesperado - até chegar no momento que está sozinho com o vácuo e tem que encarar a realidade - talvez fosse mais interessante? Bem, é uma ideia xD

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